Prévias do PSDB viraram briguinha de compadre, diz Arthur Virgílio
Foto: Divulgação

Mais anticandidato do que azarão nas prévias presidenciais do PSDB, o ex-prefeito de Manaus Arthur Virgílio Neto afirma que o processo se tornou uma “briguinha de comadres e compadres” que enfraqueceu o partido.
 

Na segunda (15), seu time assinou com o do governador João Doria (SP) uma nota de repúdio contra o terceiro rival na disputa, o governador Eduardo Leite (RS), cujos coordenadores de campanha propuseram o adiamento da votação prevista para o domingo (21) devido a dúvidas acerca do processo de votação.
 

“Me dá muita vergonha isso. Temos de alguma maneira consertar esse partido para que o partido possa ajudar a consertar o país”, afirmou.
 

Apesar de jogar em dupla com o paulista também nos debates entre os candidatos, Virgílio não o poupa de críticas. “Ele é bom gestor, mas falha na política”, afirmou.
 

Ao manter sua candidatura, apesar de considerar não ter chances reais, Virgílio afirma querer ajudar a aperfeiçoar o processo das prévias até chegar ao nível de uma primária norte-americana.
 

Ao fim, sua presença está sendo benéfica a Doria, por reforçar posições contra Leite vindas de um representante da velha guarda tucana.
 

Aos 76 anos, tendo passado pela trágica crise da Covid-19 em sua cidade, ele compara o PSDB a um pinscher, um cachorro pequeno e bravo, que late como um pitbull amparado em suas glórias passadas.
 

Sobre Leite, estrela emergente da nova geração tucana com 40 anos a menos do que ele, Virgílio é lacônico. O vê como pouco experiente e influenciado pelo deputado Aécio Neves (MG), a quem atribui culpa pelo apoio da bancada da Câmara ao governo Jair Bolsonaro.
 

Na sua visão, Leite crê que Aécio o apoia, quando na verdade o deputado quer ver o PSDB sem candidatura própria em 2022 para focar na construção de uma sigla de caráter parlamentar. Tanto o gaúcho, quanto o mineiro, negam isso.

PERGUNTA – Como o sr. avalia as prévias do PSDB? O processo está sendo uma carnificina política.
 

ARTHUR VIRGÍLIO – É preciso ter uma mão muito firme para a coisa não se desvirtuar. Esse episódio de ontem [segunda, 15] foi lamentável, mostra uma máquina em ação. Me dá muita vergonha isso, eleição você não adia. Imagina, eu não me sinto seguro e peço para adiar. Temos de alguma maneira consertar esse partido para que o partido possa ajudar a consertar o país.
 

Temos duas pessoas em colisão, como se isso [vencer as prévias] significasse [conquistar] a Presidência da República. O partido está enfraquecido e com uma repercussão nacional brutal, negativa, com o apoio dado na Câmara à PEC dos Precatórios. Até o líder [Rodrigo de Castro, de MG] votou com o governo.
 

A que o sr. atribui isso?
 

AV – Sabe, tem um espírito de trevas, que não era assim mas virou, que é o Aécio Neves. O Tasso Jereissati [senador pelo Ceará que deixou as prévias para apoiar Leite] ainda tem suas razões, mas o Aécio quer tomar conta do partido.
 

Isso vai de encontro a uma crítica que diz que o Aécio quer ver o PSDB como uma sigla parlamentar, do centrão.
 

AV – Exatamente, ele acha que não tem de ter ambição presidencial e que é preciso filiar deputados de baixo clero. Aí ele pode se aliar com Deus aqui, o Diabo acolá, para conseguir o máximo de dinheiro para as eleições proporcionais.
 

Nos tempos do [presidente de 1995 a 2002] Fernando Henrique Cardoso, o então PFL e o então PMDB eram nossos aliados, mas com características diferentes. Nós sempre tínhamos uma bancada forte, mesmo na oposição a Lula. Mas éramos sempre a segunda ou terceira bancada, e o PMDB ou o PFL ficavam com a presidência da Câmara. Nós tínhamos respeitos aos rituais.
 

Mas o Aécio foi presidente da Câmara [2001-2002], e o certo na época era entregar ao PFL o cargo. Com isso, na campanha presidencial de 2002, os votos da Bahia foram para o Ciro Gomes [hoje no PDT], e o [então candidato tucano ao Planalto] José Serra quase não chega ao segundo turno.
 

Como o sr. vê o apoio dele ao Leite?
 

AV – O Leite, com a pouca experiência que tem, pode acreditar muito que o Aécio está preocupado com sua candidatura. Eu não perderia um segundo com isso. De todo modo, ainda precisamos aperfeiçoar as prévias.
 

Meu voto como pré-candidato vale 12,5 vezes menos do que a de um vereador. Mas eu aceitei isso porque é o início de um processo que vai ser melhorado, até chegarmos a ter primárias como as dos EUA. Mas é um processo melhor.
 

Em 2006, por exemplo, fomos o FHC, eu, líder no Senado, o Jutahy Magalhães, líder na Câmara, o Tasso, que presidia o partido, à casa do secretário-geral Eduardo Paes. Consagramos o Serra candidato. Mas depois, num jantar em São Paulo, o escolhido foi o [então governador paulista] Geraldo Alckmin.
 

Aí vimos aquela eleição pueril do Alckmin, que teve menos voto no segundo turno do que no primeiro. Esse endeusamento que parte do PSDB faz do Alckmin não é sincero, ele não é essa Coca-Cola toda. É um problema deles com o Doria, que quer o [atual vice] Rodrigo Garcia candidato em São Paulo em 2022.
 

As prévias que eu idealizei… eu me senti muito ingênuo. Achei que elas seriam prévias sérias, sobre o país, não essa briguinha de comadre e compadre. Teve uma pessoa que me pediu para não ir a Minas, outra que falou para não ir a um reduto que seria de Leite. Estão vendendo para ele [Leite] a ideia de que as prévias são uma eleição definitiva que ele pode se o presidente mais jovem do país, isso enche a vaidade de qualquer um.
 

Por que o sr. insiste então?
 

AV – Eu tentei não ser candidato, mas agora estou numa cruzada. Não abro mão de voto, estou lutando por voto. Não há democracia perfeita. A gente tem de olhar para a mulher, para o negro, para o índio. É um despautério a violência por orientação sexual. Como posso considerar democrático um país com essas lacunas?
 

Eu nunca abandonei um mandato, até por isso nunca consegui disputar o governo do estado no Amazonas. Em relação a meus adversários, isso é uma vantagem. Quando eu digo que sou a favor da reeleição, diferentemente deles, sou claro. Aceito uma coisa inferior técnica e eticamente, que é o mandato de seis anos, mas a reeleição é boa. Veja os dois mandatos do FHC, que foram de paz, com uma transição tranquila.
 

Quando o Lula ganhou, o [então ministro da Fazenda Antonio] Palocci manteve nossa política. O importante é ter inflação controlada, câmbio controlado, transformar o Brasil num país capitalista.
 

Acredita que possa haver união partidária depois do processo?
 

AV – A maioria da bancada na Câmara foi leviana [na votação da PEC do Calote]. Nas prévias, não foram seguidos processos de equidade. O problema é como o partido é. É como um pinscher, que é um cachorro pequeno mas avança como um pitbull.
 

Nós somos um partido médio. Perto do que já fomos, somos pequenos. Não podemos viver a vida toda de nosso legado. Claro, a herança do tripé econômico é uma grande contribuição, muito útil, e que poderia resolver a situação atual.
 

Qual deve então ser o papel do partido em 2022? O PSDB necessariamente deve ter um candidato?
 

AV – O partido tem de olhar as condições objetivas e, se sentir que está impossibilitado de chegar ao país, fazer a melhor aposta possível. Mas é preciso fazer de tudo para ter uma candidatura autóctone. Temos essa característica de ter disputado todas as eleições. É muito difícil para mim, um cara da velha guarda, aceitar a ideia de não termos um candidato.
 

Claro, houve os 4% do Alckmin em 2018. Quando eu vejo um cara desses, saindo do partido, sendo endeusado, por pessoas que não o ajudaram em nada… O partido se portará de maneira beócia se, depois de tudo isso, permanecerem as implicâncias.
 

Qual sua avaliação acerca da rejeição do Doria entre aliados e no próprio partido? Tem a ver com a ideia de que ele traiu o Alckmin em 2017?
 

AV – É algo impressionante. Mas acho que não tem a ver com traição, porque o Brasil às vezes até premia o traidor. Sinceramente, o Doria faz um bom governo. Se ele não traz a vacina, estaríamos numa situação ruim.
 

Mas é aquilo: ele foi receber uma pessoa muito ilustre, velho amigo meu, e aí coloca um relógio sobre a mesa [para cronometrar o encontro]. O que custava atrasar umas horas para atender aquela pessoa? Ele é um bom gestor, mas falha na política.
 

Ele botou esse relógio para mim mil vezes, eu não estou nem aí. Se ele acha que acabou a conversa, só dizer, nós somos amigos, nossos pais foram amigos e cassados na ditadura.
 

Eu falo para ele: João, você faz um governo do cacete, que porra está havendo? Eu faço política pegando muito nas pessoas, com todo respeito, brinco muito, há 43 anos.
 

Qual sua opinião sobre a gestão econômica do Bolsonaro?
 

AV – É um desgoverno. Uma esperteza nociva para dar dinheiro para ele [Bolsonaro] e os acólitos que o sigam. Veja que projeto perverso: eu arrombo o teto, alargo o espaço fiscal e vou à luta. Aí as pessoas que foram atingidas pela inflação são atendidas com o dinheiro do teto que aumentou a inflação e a fome.
 

É uma certa desilusão, eu apreciava o Paulo Guedes, porque uma coisa dessas não sai da cabeça do Bolsonaro. Guedes não é um bobo, acredito que ele bolou tudo isso. Ele não faz nada para cortar despesas ou implementar respostas.
 

Até pelo seu histórico, o sr. fala muito de Amazônia. Como ela se insere nessa visão?
 

AV – Se não fizemos besteira, teremos a questão da intervenção internacional da Amazônia. O Amazonas, disseram na COP26, teria 98% de cobertura de floresta. É mentira. O último dado é de 94%, talvez seja menos, vamos virar um Pará. Pensa no que se perdeu de biodiversidade.
 

E a proteção do Amazonas é o Polo Industrial de Manaus. Quando os EUA quiseram desenvolver o vale do Tennessee, deram incentivos fiscais. Floresta e rio são irmãos siameses. Se a floresta desaba, o rio seca, e vice-versa. Quem não entender isso não pode ser presidente da República.
 

As pessoas endeusam a Amazônia, mas odeiam a Zona Franca, mas ela tem só 8% dos incentivos fiscais totais no país. Isso para manter 94% da floresta é muito? Essa mentira nem parte do Bolsonaro, ele não sabe nada. Se eu pudesse, dava uma régua de cálculo. Como minha professora, com outra régua dava na mão dele [risos].
 

RAIO-X
 

O diplomata Arthur Virgílio Neto, 76, nasceu em Manaus (AM), cidade da qual foi prefeito por três vezes (mandatos iniciados em 1989, 2013 e 2017). Quadro do antigo PCB na ditadura militar, migrou para o MDB, PMDB e PSB antes de entrar no PSDB em 1989. Foi ministro da Secretaria-Geral da Presidência (2001-2002, governo FHC), deputado federal e senador.

Fonte: Bahia Notícias

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